A transição para uma sociedade neutra em carbono é um dos objetivos centrais do nosso século. Esta transição exige ações para uma redução célere e profunda das emissões de gases com efeito de estufa (GEE), em todos os setores de atividade.
Desta forma, e a par das ações de mitigação a adotar no âmbito do processo de transição climática elencadas no Plano Nacional Energia e Clima 2030 (PNEC 2030) e no Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC 2050), é crucial recorrer aos diversos tipos de instrumentos que estejam ao nosso dispor e que permitam apoiar os objetivos e metas climáticas definidos a nível nacional, europeu e internacional.
Neste contexto, foi publicado o Decreto-Lei n.º 4/2024, de 5 de janeiro, que institui o mercado voluntário de carbono em Portugal e estabelece as respetivas regras para o seu funcionamento. Como principais objetivos deste diploma destacamos:
- Transição para uma Sociedade Neutra em Carbono: contribuindo para a mitigação de emissões de GEE no território nacional e o cumprimento dos compromissos nacionais, europeus e internacionais assumidos por Portugal em matéria de mitigação das alterações climáticas, em linha com os compromissos assumidos nos instrumentos de planeamento estratégicos, como o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC 2050) e o Plano Nacional Energia e Clima 2030 (PNEC 2030);
- Promover a mobilização e participação dos agentes à escala local e regional e dar resposta a uma maior consciencialização da sociedade;
- Sequestro de Carbono e Benefícios Naturais, o mercado voluntário de carbono incentiva soluções baseadas na natureza para o sequestro de carbono. Isso não apenas ajuda a alcançar a neutralidade carbónica, mas também beneficia a biodiversidade, regulação dos ciclos naturais e resiliência do território. Projetos ambientalmente sustentáveis e economicamente viáveis são promovidos para gerir as emissões de GEE de forma eficiente e eficaz;
- Promover os benefícios ambientais e socioeconómicos, designadamente promover o capital natural, que possam advir dos projetos de mitigação.
De acordo com o artigo 3.º do Decreto-lei em análise, o mercado voluntário de carbono rege-se pelos princípios:
- Credibilidade, garantindo que os projetos assentam em cenários de referência realistas e robustos para efeitos de contabilização de reduções de emissões de GEE ou sequestro de carbono;
- Adicionalidade: Os projetos de carbono devem ser adicionais em termos climáticos, regulatórios e financeiros, contribuindo para a trajetória rumo à neutralidade carbónica;
- Permanência, acautelando a manutenção do sequestro de carbono e garantindo a existência de salvaguardas que permitam compensar situações de reversão
- Eficácia, evitando potenciais fugas de carbono provocadas pelo aumento de emissões de GEE ou redução do sequestro de carbono, fora da fronteira do projeto, motivadas pela sua implementação;
- Acompanhamento, garantindo a existência de um processo de monitorização, reporte e verificação robusto para contabilização das reduções de emissões de GEE ou sequestro de carbono que resultem da atividade do projeto;
- Transparência, garantindo o acesso público à informação relativa às atividades desenvolvidas pelos vários participantes no mercado voluntário de carbono e evitando a existência de dupla contagem de créditos de carbono, ou seja, de redução de emissões de GEE ou sequestro de carbono;
- Sustentabilidade, promovendo a existência de cobenefícios ambientais e socioeconómicos, em linha com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável, e criando salvaguardas para anular ou minimizar o risco de externalidades negativas
O mercado voluntário de carbono incide sobre tipologias de projetos de redução de emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE) e projetos de Sequestro de Carbono (soluções de base natural, potenciadoras de benefícios para a biodiversidade, designadamente através de projetos de florestação e reflorestação e soluções tecnológicas), desenvolvidos em território nacional, que promovam a mitigação de emissões dos Gases com Efeito de Estufa (GEE)
A admissibilidade de tipologias de projetos de carbono no mercado depende da aprovação e publicação das correspondentes metodologias, nos termos do presente decreto-lei.
Os projetos de carbono devem cumprir os princípios fundamentais e critérios de elegibilidade definidos no presente decreto-lei e respetivas orientações constantes nas metodologias de carbono reconhecidas para cada tipologia de projeto. Para efeitos de desenvolvimento e avaliação de metodologias de carbono é criada uma comissão técnica de acompanhamento com representantes das entidades relevantes, coordenada pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA, I. P).
As reduções de emissões de GEE (1) ou o sequestro de carbono obtidos através de projetos no âmbito do mercado voluntário de carbono geram créditos de carbono. Estes créditos podem assumir as formas de créditos de carbono futuros (CCF), ou de créditos de carbono verificados (CCV), sendo estes transacionáveis, devendo o fluxo de créditos entre os agentes de mercado ser assinalados na plataforma de registo de projetos e de créditos de carbono, que será desenvolvida pela Agência para a Energia (ADENE).
Com efeito, cabe à ADENE, sob supervisão da APA, I. P., o desenvolvimento e gestão da plataforma de registo de projetos e de créditos de carbono, e o acompanhamento e monitorização do mercado.
A plataforma de registo de projetos e de créditos de carbono é um instrumento essencial para o funcionamento do mercado voluntário de carbono, pois garante a transparência das atividades desenvolvidas no âmbito deste mercado e minimiza os riscos de dupla contagem de emissões.
Em suma, estabelecidas as bases para o funcionamento deste mercado voluntário de carbono, espera-se que com o tempo, se torne mais uma ferramenta eficaz para transição para uma sociedade neutra em carbono.
(1) Artigo 11º do Decreto-Lei nº 4/2024, 5.01