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amarelo
Nível de Risco
Existência de indícios de possíveis problemas que possam afetar significativamente o sector petrolífero.A probabilidade de se tornar uma ameaça real é baixa, mas deverá existir uma monitorização contínua da situação.

Causes:
Devido aos problemas de fornecimento elétrico, a ENSE encontra-se a monitorizar os impactos no Setor Petrolífero Nacional.

As reações ao incumprimento da obrigação de incorporação de biocombustíveis

26/06/2020

A Diretiva 2009/28/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Abril de 2009, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis – Diretiva Renováveis “DER” – veio fixar para os Estados-Membros objetivos obrigatórios para a quota global de energia proveniente de fontes renováveis no consumo final bruto de energia e no caso específico dos transportes, os quais passam por, até 2020, ter 20% de energia proveniente de fontes renováveis no consumo bruto de energia, mais se fixando uma submeta de incorporação de 10% de fontes de energia renováveis no consumo final de energia no sector dos transportes, na medida em que este representa o sector com o aumento mais rápido de emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE).

No quadro do objetivo comunitário supra, de obrigatoriedade de incorporação de 10% de energia proveniente de fontes renováveis no consumo final de energia nos transportes em 2020, o Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro [1], veio estabelecer as metas anuais obrigatórias de incorporação em percentagens [2] de biocombustíveis, em teor energético, relativamente às quantidades de combustíveis rodoviários colocados no consumo [3] .
Nestes termos, o Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro, materializa o instrumento nacional para o cumprimento das metas de incorporação previstas pela União Europeia no setor dos transportes, configurando, nessa medida, um regime obrigatório e vinculativo, cuja matriz visa a prossecução de um objetivo de natureza ambiental e energético comum.

Com efeito, nos termos do n.º 1 do artigo 11.º do referido diploma, “As entidades que introduzam combustíveis rodoviários no consumo, processando as declarações de introdução no consumo (DIC) nos termos do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo (..), abreviadamente designadas por incorporadores [4] , estão obrigadas a contribuir para o cumprimento das metas de incorporação nas seguintes percentagens de biocombustíveis (..)”, aí fixando-se os limites de incorporação obrigatória de biocombustíveis para aos anos de 2011 a 2020.

O cumprimento das referidas obrigações de incorporação de biocombustíveis é comprovado, trimestralmente, através da apresentação de títulos de biocombustíveis (TdB) pelos incorporadores, sendo o referido controlo administrativo feito pela Entidade Nacional para o Setor Energético, E.P.E. (ENSE), entidade competente para a verificação trimestral do cumprimento das metas de incorporação de cada operador.
Ainda para efeitos da verificação do cumprimento das referidas metas, o Decreto-Lei n.º 117/2010 mais estabelece um sistema de emissão de TdB, os quais são emitidos após a verificação dos critérios de sustentabilidade para os biocombustíveis líquidos, fixados no diploma [5].

Cada TdB comprova a incorporação de uma tonelada equivalente de petróleo (Tep) de biocombustíveis destinados a serem incorporados no consumo nacional, sendo que, nos termos do referido diploma, os TdB – que são válidos por dois anos -, são livremente transacionáveis entre operadores económicos, dando a cada incorporador a opção de comprovar o cumprimento da sua meta através dos TdB provenientes da incorporação de biocombustíveis no combustível fóssil ou da aquisição desses títulos a outros agentes que os tenham em excesso (vide preâmbulo do Decreto-Lei n.º 117/2010).

Os incorporadores que não cumpram a respetiva meta de incorporação de biocombustíveis, através da apresentação de TdB, ficam sujeitos ao pagamento de compensações [6], no valor de 2.000,00€ por cada TdB em falta [7].
Assim, o artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, vem estabelecer para os incorporadores uma obrigação (a de incorporação de determinada percentagem de biocombustível, em teor energético, relativamente às quantidades de combustíveis rodoviários por si colocados no consumo), que, no caso do seu incumprimento, conduz à aplicação da compensação do n.º 1 do artigo 24.º do diploma, materializando-se, nessa medida, a compensação como uma sanção administrativa (não penal e não contraordenacional).

Em alternativa à aplicação da compensação, a ENSE, mediante requerimento do incorporador, pode autorizar o cumprimento da obrigação de incorporação no trimestre seguinte, considerando-se a obrigação de incorporação cumprida com a apresentação dos TdB na razão de 1,5 vezes por cada TdB em falta [8], podendo, desta forma, o operador evitar a sanção principal – o ato administrativo sancionatório compensação – através de uma obrigação alternativa, que constitui um sacrifício adicional.
Temos, assim, uma decisão de imposição de um sacrifício pecuniário, que surge após a verificação do incumprimento, pelo incorporador, da regra de obrigação de incorporação de biocombustíveis, mais se fixando uma alternativa à compensação, mediante um pedido feito à ENSE.

O n.º 4 do artigo 24.º do diploma mais vem prever a possibilidade de suspensão de certificação de interveniente do Sistema Petrolífero Nacional do incorporador que não regularize a respetiva obrigação de incorporação, suspensão que perdurará pelo período em que o incorporador não regularize a situação de incumprimento, sendo que, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 152-C/2017, de 11 de Dezembro, a Direção-Geral de Energia e Geologia é a entidade competente para a determinação da suspensão do referido certificado, após comunicação, pela ENSE, do incumprimento.
Com efeito, o não cumprimento da obrigação de incorporação, materializado na liquidação da compensação ou no cumprimento da sua obrigação no trimestre seguinte com a apresentação de TdB na razão de 1,5 vezes por cada TdB em falta, vem, nesta medida, acompanhado por medidas administrativas sancionatórias, respeitantes à atividade desenvolvida pelo operador, de efeito suspensivo.

Assim, no quadro do Decreto-Lei n.º 117/2010, a compensação materializa uma reação sancionatória [9], não contraordenacional, ao incumprimento da incorporação de biocombustíveis, substituível por outra medida de reparação e acompanhada por medidas administrativas sancionatórias, in casu, respeitantes à atividade desenvolvida pelo incumpridor.

Ao quadro sancionatório supra descrito, acresce um regime contraordenacional associado, aplicável quando aquele não convolar em cumprimento da obrigação de incorporação.
Com efeito, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, o não pagamento pontual das compensações previstas no artigo 24.º do mesmo diploma, constitui contraordenação.
Temos, assim, duas realidades sancionatórias de natureza distinta, que surgem elencadas no Capítulo V do diploma, sob a epígrafe Compensações e regime contraordenacional, como compensação e reação do incumprimento.
Realidades sancionatórias distintas, pois que:

  1. O Decreto-Lei n.º 117/2010 tem um lugar próprio, no seu artigo 24.º, para a compensação pelo não cumprimento das obrigações de incorporação de biocombustíveis e um lugar próprio, no seu artigo 25.º, dedicado às contraordenações, no qual o não cumprimento da obrigação de pagamento da compensação surge elencado como facto contraordenacional;
  2. Não resulta do leque das contraordenações do referido artigo 25.º, o incumprimento da apresentação de TdB como contraordenação [10] ;
  3. O Decreto-Lei n.º 117/2010 não faz depender a aplicação da compensação da prova de culpa do operador, mas do facto do mesmo deter ou não os títulos de biocombustível a que está obrigado;
  4. Não existe uma definição legal de montante mínimo e máximo da compensação a aplicar;
  5. O procedimento para a instrução dos processos de contraordenação e aplicação das correspondentes coimas e sanções acessórias e o procedimento para a determinação e aplicação da compensação são cometidos a entidades diferentes;
  6. Também o produto das compensações e o produto das coimas reverte para entidades distintas [11].

Em suma, o Decreto-Lei n.º 117/2010, face à verificação do incumprimento, pelos incorporadores, da sua obrigação de incorporação de biocombustíveis nos termos do artigo 11.º do diploma, estabelece as várias reações a esse incumprimento, as quais se materializam:

  • Na aplicação da compensação pecuniária (sancionatória) do n.º 1 do artigo 24.º; 
  • Em alternativa à compensação, o cumprimento da meta de incorporação com sacrifício adicional de carácter sancionatório do n.º 2 do artigo 24.º;
  • No caso de os incorporadores em incumprimento não regularizarem a respetiva obrigação de incorporação nos termos dos pontos supra, suspensão da sua atividade, materializada na suspensão do certificado do Sistema Petrolífero Nacional, nos termos do n.º 4 do artigo 24.º; 
  • Acrescendo, quando as referidas reações sancionatórias não resultarem, a contraordenação pelo não pagamento pontual da compensação, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 25.º 

Ora, a ENSE, no âmbito das competências que para si resultavam no âmbito do Decreto-Lei n.º 117/2010, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 69/2016, de 3 de Novembro, e após a conclusão dos procedimentos administrativos referentes à verificação do cumprimento das metas de incorporação referentes aos períodos de 2013 e 2014; 2015 [12] ; 2016; 1.º Trimestre de 2017 [13] e 2.º Trimestre de 2017 , aplicou a diversos incorporadores incumpridores as compensações previstas pelo incumprimento da obrigação de incorporação de biocombustíveis o que, atentos os valores pecuniários envolvidos, gerou litigância por parte dos operadores incumpridores, encontrando-se a correr termos, à presente data, nos Tribunais Administrativos cerca de 20 processos de impugnação dos atos administrativos (sancionatórios) de aplicação de compensações.

Por fim refira-se que, a instrução dos processos de contraordenação instaurados no âmbito do Decreto-Lei nº 117/2010, e, bem assim, a aplicação das correspondentes coimas e sanções acessórias são da competência da ENSE.
Ora, pese embora tenha a ENSE, até 1 de Janeiro de 2018 – data em que a competência para a determinação e liquidação do pagamento das compensações transitou para a Direção-Geral de Energia e Geologia, atenta a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 152-C/2017, de 11 de Dezembro -, aplicado compensações aos operadores incumpridores nos termos supra, à presente data não correm termos, nesta entidade pública, quaisquer processos de contraordenação pelo não pagamento pontual de compensações, atentas as referidas impugnações contenciosas, apresentadas pelos incumpridores, às compensações aplicadas pela ENSE.

 

[1] Que veio transpor para a ordem jurídica nacional a Diretiva 2009/28/CE (DER), alterada pela Diretiva (UE) 2015/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 9 de setembro. Esta última Diretiva foi transposta pelo Decreto-Lei n.º 152-C/2017, de 11 de dezembro, que deu a última redação, hoje em vigor, ao Decreto-Lei n.º 117/2010.
[2] Em 2011 e 2012 de 5,0%; em 2013 e 2014 de 5,5 %; em 2015 e 2016 de 7,5 %; em 2017 e 2018 de 7,5 %[1];  e em 2019 e 2020 de 10,0 %. A meta de incorporação para os anos de 2017 e 2018 estava, ab initio, prevista para 9%, tendo sido alterada nos Orçamentos de Estado para 2017 e 2018 por forma a se manter nos 7,5%.
[3] Com excepção do gás de petróleo liquefeito (GPL) e do gás natural.
[4] Atenta a alteração à redação do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 177/2010 operada pelo Decreto-Lei nº 6/2012, de 17 de Janeiro, procedeu-se à clarificação das entidades incorporadores de biocombustíveis no mercado e, bem assim, ao âmbito das obrigações a que as mesmas se encontram sujeitas.
[5] Desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 152-C/2017, de 11 de Dezembro, a entidade responsável pela emissão dos TdB – Entidade Coordenadora do Cumprimento dos Critérios de Sustentabilidade (ECS) – funciona junto do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG). A ENSE, além de entidade competente para a verificação trimestral do cumprimento das metas de incorporação de cada operador, mais é responsável pelo cancelamento de TdB e, bem assim, pela monitorização das transações de TdB entre operadores e o stock de TdB de cada operador.
[6] Desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 152-C/2017, de 11 de Dezembro, Direção-Geral de Energia e Geologia é a entidade competente para a determinação e liquidação das compensações.
[7] Cfr. n.º 1 do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, na sua redação atual.
[8] Cfr. n.º 2 e n.º 3 do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, na sua redação atual.
[9] Atenta a natureza sancionatória da compensação, arredada fica a sua qualificação como tributo.
[10] A alínea a) do n.º 1 do artigo 25.º do diploma, que estabelecia como contraordenação o não cumprimento da apresentação de TdB como comprovativo da incorporação de biocombustíveis, foi revogada pelo artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 69/2016, de 3 de Novembro.
[11] O produto das compensações reverte para o Fundo Ambiental e para o Fundo de Eficiência Energética, ao passo que o produto das coimas previstas no artigo 25.º do diploma, revertem para as entidades e proporções fixadas no n.º 2 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 117/2010;
[12] Por referência ao períodos de 2013 e 2014 e ao período de 2015, e atenta a alteração legislativa ao Decreto-Lei n.º 117/2010 operada pelo Decreto-Lei n.º 69/2016, de 3 de Novembro, a, à data, ENMC, recebeu por parte da DGEG, entidade competente para a aplicação e liquidação de compensações nos termos da redação original ao Decreto-Lei n.º 117/2010,  os processos relativos à verificação das metas de incorporação de biocombustíveis, tendo concluído pela aplicação de compensações aos incorporadores incumpridores.
[13] Tendo a competência para a determinação e liquidação do pagamento das compensações transitado para a DGEG no dia 1 de janeiro de 2018, atenta a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 152-C/2017, de 11 de Dezembro, a ENSE remeteu oficiosamente à DGEG os processo de verificação de incumprimento das obrigações de incorporação de biocombustíveis referentes ao 3.ºTrimestre de 2017.