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amarelo
Nível de Risco
Existência de indícios de possíveis problemas que possam afetar significativamente o sector petrolífero.A probabilidade de se tornar uma ameaça real é baixa, mas deverá existir uma monitorização contínua da situação.

Causes:
Devido aos problemas de fornecimento elétrico, a ENSE encontra-se a monitorizar os impactos no Setor Petrolífero Nacional.

Entrevista a Alexandre Fernandes sobre os objetivos estratégicos do mandato 2023-2025

31/05/2023

Alexandre Fernandes, foi nomeado pelo Governo, no passado dia 11 de abril, Presidente do Conselho de Administração da ENSE, para um mandato de três anos. Anteriormente, foi Vogal Executivo desta Entidade, cargo que desempenhou nos últimos dois anos. Foi igualmente, nos últimos anos, dirigente do grupo Shell e da Agência para Energia (ADENE).

No âmbito da sua nomeação, colocamos algumas questões sobre as suas ambições para a ENSE neste novo triénio.

Foi nomeado Presidente do Conselho de Administração da ENSE no passado dia 11 de abril, onde exerceu o cargo de Vogal Executivo desde abril de 2021. Após estes dois anos de atividade nesta Entidade, quais são os seus principais objetivos estratégicos para este mandato? Quais são as áreas que, no seu entendimento, é necessário desenvolver?

A.F.: Pretendo neste mandato, dar continuidade às áreas que já têm um nível de excelência alcançado, nas outras onde provavelmente o nível de alcance de resultados ou de expectativas ainda não está nesse nível, há que inovar e desenvolver novas competências, inclusivamente porque há novas incumbências que recebemos recentemente, quer com a publicação nas áreas do Gás Natural, quer com a publicação dos diplomas nas áreas da bioenergia.
Uma das áreas na qual vamos ter maior nível de interação, e que não tínhamos, será a área das Reservas de Gás Natural. Nas áreas da bioenergia e, refiro-me a bioenergia e não biocombustíveis, porque na realidade a área da bioenergia integra vários novas componentes para além dos biocombustíveis, passa a haver o biogás, e os designados high blendings, ou seja, os combustíveis de baixo carbono, como seja os próprios B100 em várias vertentes, uma delas já esta inclusivamente no terreno – o HVO, onde passa a haver uma integração daquilo que era a bioenergia com o próprio hidrogénio e, portanto, são tudo áreas onde há aqui uma nova vertente. Nesta nova faceta que vamos começar, é igualmente importante não esquecer, à partida, aquilo que são as áreas de elevada performance, onde importa igualmente incorporar novas atividades, mas onde o esforço para alcançar o nível de excelência já não será tão grande, porque já o alcançámos ou estamos muito perto dele.

O Decreto-Lei nº 70/2022, veio criar uma reserva estratégica de gás natural, pertencente ao Estado Português, cuja constituição, gestão e manutenção ficarão a cargo da ENSE. Que novos desafios se apresentam agora à Instituição com estas novas competências?

A.F.: A primeira vertente é claramente a armazenagem e o papel que a ENSE tem junto das entidades que operam essa vertente. A REN e a GALP, são entidades que, atualmente, têm atividades específicas nessa matéria. A Galp na área do GNL. Já na área do chamado understorage gas (USG), o gás armazenado em cavernas salinas, esse é incumbência em termos de Reserva de Segurança do incumbente REN. Estas eram as únicas duas entidades que, de alguma forma, tinham um papel em termos de Reservas. A partir de agora, há uma terceira entidade, que somos nós, que têm a incumbência de gerir a componente de reservas definidas como estratégicas, que se juntam às de segurança de abastecimento.
A segunda vertente, estará relacionada com as metodologias que têm que ser elaboradas para criar uma interação entre as introduções ao consumo e as referidas reservas estratégicas. Teremos de legislar no sentido de definir número de dias de Introduções ao Consumo, que vamos ter na forma de reserva estratégica. Estas deverão ter uma correlação com o número de dias e não tanto com a quantidade em volume ou em MWh. Portanto a lógica será a mesma que temos para outros produtos energéticos.
Há uma terceira vertente, que tem que ver com as áreas de apoio administrativo que temos que criar e, aí, a interação será através do Balcão Único da Energia (BUE), onde terão que ser criadas novas áreas e novos mecanismos de interação com os operadores.

Com a obtenção da acreditação nas áreas da Mobilidade Elétrica, Equipamentos sob Pressão e Postos de Enchimento de Gás Natural Veicular, a ENSE reforçou, em 2023, a sua credibilidade enquanto entidade fiscalizadora do setor energético. Muito se tem feito nesta área, mas muito falta ainda fazer. Quais são as suas perspetivas para este setor?

A.F.: A principal questão que teremos de analisar é, na interação que temos precisamente com o Balcão Único da Energia, listar no BUE, os postos de abastecimento que vão para além dos postos de abastecimento de combustíveis. Temos, neste momento, cerca de 3 mil postos de abastecimento registados no BUE, o que quer dizer que faltam lá cerca de um milhar, que estão relacionados com os postos de carregamento elétrico ou com os postos de enchimento de gás natural veicular. Quando pesquisarmos no BUE teremos que passar para uma dimensão, no mínimo, de 4 mil postos de acesso público, no país. Estes têm que ser objeto do Balcão Único e tem que ser uma interação direta com os todo os operadores. Isto vai criar a dimensão de kWh ou MWh que se agrega à dimensão litro ou kg e na realidade, precisamos de nos adaptar a uma outra unidade que é a unidade elétrica e aí estaremos a falar de MWh. As equipas de fiscalização devem fazer igualmente a sua “transição”, deixando de estar organizadas por produto, para passarem a estar orientadas por tipologia de consumidores, isto é, mobilidade, indústria, residencial ou serviços.

Num mundo onde as pessoas são, nos dias de hoje, o epicentro das organizações, o papel de dirigente torna-se cada vez mais desafiante. Que estratégias de liderança, são na sua perspetiva, fundamentais para reter talentos e motivar as pessoas para a excelência no serviço público?

A.F.: É uma pergunta muito ambiciosa. Atualmente e, cada vez mais, quando recrutamos novos quadros, importa que essa pessoa possa aprender novas metodologias e conhecimentos, mas igualmente, que possa dar e incorporar muito do seu contributo pessoal na própria empresa onde inicia funções. Quanto mais aberta à aprendizagem e à partilha, a pessoa for, melhor. As organizações vivem muito do “dar” e “receber”, ou seja, as empresas preparam mecanismos de formação profissional, mecanismos motivadores em termos de comportamentos e atitudes que, na realidade, põem a pessoa mais à vontade e, de forma mais interativa a trabalhar e a participar naquilo que é a atividade da empresa. E é essa realidade que importante fomentar e incentivar: o facto de as pessoas terem a capacidade de participar em trabalhos multissetoriais, dar o seu contributo em áreas que, no seu dia-a-dia, não são a sua zona de conforto, poderem expor-se e entrar noutros domínios. Além disso, há outras questões que estão relacionadas com a existência de novas formas de trabalho que passam, muitas vezes, pelo trabalho virtual, pelo teletrabalho e pela possibilidade que é dada às pessoas de terem um trabalho mais balanceado com a sua vida social – desde que não prejudique a empresa, nem a própria pessoa. Por outro lado, é preciso ter consciência, que quando se dá esse tipo de responsabilidades às pessoas, elas passam igualmente a ter outra exposição e outra forma de interagir com a empresa e, portanto, tudo isto são fatores extremamente relevantes para a sua evolução e para o dia-a-dia. E a motivação que, aqui há uns anos passava por coisas muito objetivas, isto é, questões relacionadas com o espaço onde a pessoa trabalhava – se era mais ou menos interessante, mais ou menos agradável, ou pelo valor pecuniário que a pessoa tinha para o seu trabalho e, não quer dizer que estes dois vetores não sejam extremamente importantes, atualmente, porque são, é agora algo que está relacionado com um conjunto mais abrangente de vertentes. Há alguns anos, quando tinham uma simples gripe, as pessoas dificilmente faltavam ao trabalho, era quase proibitivo e atualmente, o que é quase proibitivo é exatamente o contrário. Na minha interação com pessoas da Escandinávia, deparei-me com várias situações em que para os dinamarqueses, os suecos, era impensável reunir numa sala em que alguém estivesse constipado ou com uma gripe e, para nós, era exatamente o contrário, pois íamos na mesma, fazíamos o sacrifício pessoal, mas era bem-vindo. Com a questão da Covid tivemos que incorporar modos de agir na empresa e ter formas de interagir com as pessoas de forma diferente. Isso também obriga a que a pessoa, estando em teletrabalho, possa desenvolver as suas funções num espaço confinado, na sua casa e, sem quebrar, à partida, o seu ritmo de trabalho. Isto é um novo enquadramento que se dá às pessoas e que é diferente daquilo que é habitual. Também há necessidade, temporariamente ou de uma forma mais estruturada, de se integrar um conjunto de requisitos que vão para além daquilo que era o normal. Antigamente pensávamos que o teletrabalho supunha termos um computador portátil, um modem e, que a partir daí a pessoa estaria à vontade, mas não é bem assim. Atualmente, as questões informáticas e tudo o que envolve as regras que as empresas têm para gerir as suas próprias redes informáticas viram-se alteradas com o teletrabalho que abriu uma nova vertente. A empresa precisa de manter a sua confidencialidade de dados e a sua integridade num espaço que já era o espaço físico da empresa, e agora o espaço, é muitas vezes virtual e o computador está num meio informático diferente e, portanto, tem de haver um conjunto de regras que garantam a privacidade, quer da empresa, quer da pessoa. Para a própria proteção da pessoa tem que ficar muito claro que há um conjunto de regras que a empresa tem que respeitar e a pessoa também. Tudo isto são áreas novas, que obrigam a nível de formação e a ter novas competências. Todos nós estamos a aprender com o pós-pandemia que trouxe estas novas vertentes que têm que ser apreendidas pelas áreas de Recursos Humanos, pelas áreas mais administrativas da empresa e pelas áreas informáticas por forma a que não haja nenhum fator desmotivador ou nenhum fator que dificulte a integração ou o acompanhamento das pessoas que, momentaneamente, ou de uma forma mais estruturada, estejam nesses novos regimes de trabalho.

Com a transição energética e descarbonização da mobilidade em curso, qual é o papel da ENSE para atingir os objetivos nacionais definidos no Plano de Energia e Clima (PNEC) para o horizonte 2030?

A.F.: Esta área da transição energética é inclusiva e não exclusiva. A questão energética e da descarbonização passa por reduzir emissões de um modo economicamente viável. Há países, sobretudo asiáticos, onde, todavia se abrem novas centrais a carvão, quando na Europa os investimentos são essencialmente direcionados para as energias renováveis. Importa ter a noção que o enfoque nas renováveis e na transição energética via renováveis é claríssimo e com várias componentes essencialmente do setor elétrico, como sejam as eólicas, solar e hídrico. A eletrificação do parque automóvel é cada vez mais forte, hoje um em cada quatro ou cinco novos veículos são elétricos ou no mínimo híbridos.
Na componente dos combustíveis há uma nova vertente, a bioenergia de baixo teor em carbono, ou seja, tudo aquilo que são incorporações de biocombustíveis de cariz mais ou menos avançado. Obviamente, o que se pretende potenciar são os biocombustíveis de segunda geração, que tem uma interação mínima com a cadeia alimentar humana ou animal, e que assentam na economia circular. Aqui há um papel muito relevante para o Biogás, numa evidente massificação de áreas que até há pouco tempo eram experimentais, mas que têm um destaque cada vez maior, como seja a incorporação no Gás Natural dos designados gases renováveis, por via do referido biometano ou da vertente de hidrogénio.
Ao entrar neste domínio da transição energética, a Europa não pode criar mecanismos de não competitividade, pois é um player global, tendo assim de conciliar um conjunto de metas ambientais, mas secundados por um esforço economicamente sustentável. Importa garantir a sustentabilidade ambiental, mas também a sustentabilidade económica, pelo que os países que estiverem neste domínio têm que fazer a sua transição energética sem penalizar a sua estrutura de competitividade.
A ENSE deverá manter o seu enfoque, quer nas gestão de reservas energéticas, que estas novas formas de energia necessitam, bem como organizar as suas ações de fiscalização orientadas para as diversas formas de consumo, sejam na vertente da mobilidade, na geração de calor, frio ou mesmo iluminação.