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amarelo
Nível de Risco
Existência de indícios de possíveis problemas que possam afetar significativamente o sector petrolífero.A probabilidade de se tornar uma ameaça real é baixa, mas deverá existir uma monitorização contínua da situação.

Causes:
Devido aos problemas de fornecimento elétrico, a ENSE encontra-se a monitorizar os impactos no Setor Petrolífero Nacional.

Segurança Energética no setor da energia elétrica

27/05/2020

Neste terceiro artigo dedicado à segurança energética, continuamos o nosso propósito de abordagem deste tema de especial relevância quando se discute a transição energética “para um setor mais eficiente e de impacto mínimo para o ambiente” para fontes renováveis.

Partindo da definição de segurança de abastecimento, como a «disponibilidade de energia para servir uma determinada procura, num determinado espaço de tempo, forma e local», fruto de diversas alterações legislativas (muitas promovidas por regulamentação europeia), também ao sistema elétrico nacional (SEN) se impõe que desenvolva as ações necessárias para garantir o fornecimento de energia, e que esse fornecimento seja exequível e acessível, garantindo condições de mercado (ex.: preço ao consumidor final ) e segurança de abastecimento (ex.: que a quantidade existente para fornecimento seja compatível com as necessidades).

Por forma a abordar as várias perspetivas relativas ao tema da segurança de abastecimento, importa abordar os seguintes assuntos:

a) contexto europeu
b) enquadramento legal e regulamentar nacional
c) a segurança de abastecimento (segurança do sistema a médio e longo prazo)
d) serviços de regulação de sistema (segurança do sistema a curto prazo)
e) constituição e manutenção de reservas de segurança.

Falar de segurança de abastecimento, não é tema fácil nem simples, em especial no setor elétrico, em que o fenómeno, não se esgota no cálculo de armazenagem de um recurso, para um determinado consumo estimado. Em regra, o exercício de verificação da segurança de abastecimento, analisa a totalidade de fontes de energia disponíveis, geradoras de eletricidade (mix energético), com a previsão de crescimento do consumo de eletricidade, bem como a própria capacidade das redes de transporte e distribuição de energia. Pelo que desde logo, é necessário perceber que o sistema elétrico tem as suas especificidades físicas, das quais:

a) o sistema elétrico baseia-se num contínuo exercício de equilíbrio entre a procura e a oferta de energia elétrica;
b) os desequilíbrios entre procura e oferta não podem ficar sujeitos a longos prazos de decisão, razão pela qual a mobilização das reservas, é efetuada instantaneamente pelo operador de rede de transporte (ORT).
c) atualmente, a tecnologia ainda não permite o armazenamento de elevadas quantidades de eletricidade (1) capaz de dar resposta à procura, pelo que as reservas estão diretamente associadas à produção de energia elétrica e à capacidade de, em momentos de necessidade, entregar mais potência elétrica à rede pelos grupos geradores.

 

Contexto Europeu

No contexto europeu, as economias dos diferentes Estados Membros encontram-se vulneráveis ao abastecimento energético, dado o caráter importador da União Europeia (UE) em matéria de recursos energéticos, traduzindo-se em elevada dependência externa para o acesso a estes recursos, tornando-os altamente estratégicos e, por esse motivo, uma componente de política externa. A política energética europeia tem evoluído para dar resposta aos desafios da crescente procura energética, fruto do desenvolvimento económico. Nesse sentido e em 2006, o Livro Verde: estratégia europeia para uma energia sustentável, competitiva e segura, estabeleceu os pilares da política energética europeia, sempre numa perspetiva mercado energético integrado;

Em dezembro de 2018, foi concluído o processo legislativo dos três dossiês que fazem parte do “Pacote de Energia Limpa”, estando os Estados Membros a implementar as medidas necessárias com o compromisso de neutralidade carbónica e com objetivo de orientar todos os sistemas europeus para o cumprimento de:

É neste contexto, que a segurança de abastecimento deve ser assegurada pela diversificação de fontes e origens de energia, reforço e otimização das infraestruturas energéticas e desenvolvimento de interligações, com o objetivo de garantir um sistema resiliente e flexível a possíveis disrupções no abastecimento.

Num contexto de mercado e de sistemas de eletricidade interligados, a prevenção e a gestão de crises de eletricidade é considerado um valor europeu comum, pelo que o Conselho Europeu definiu a criação de uma União da Energia, com um regime comum de regras e procedimentos para garantir que os Estados Membros cooperem eficazmente ao nível transfronteiriço, por forma a garantir:

 

Enquadramento Legal e Regulamentar Nacional

Os Decreto-Lei n.º 29/2006 e n.º 172/2006, nas suas diversas alterações, procedem à transposição das regras de mercado interno de eletricidade, bem como da promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis, pala além de estabelecerem os fundamentos do licenciamento das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de energia elétrica.
A implementação de uma lógica de mercado nas atividades de produção, transporte e distribuição (por oposição a uma lógica de planeamento centralizado dos centros eletroprodutores) em Portugal, confere ao Estado, através da sua administração pública, com a colaboração da Entidade Reguladora e das empresas com responsabilidade de serviço público (também designadas como reguladas), a monitorização permanente do sector elétrico como forma de garantir a segurança de abastecimento de eletricidade.

Nesses termos, estabelece-se que cabe ao Operador de Rede de Transporte (ORT), a segurança e gestão global do sistema elétrico, bem como a monitorização das reservas de energia elétricas, mobilizando-as sempre que o balanço entre a procura e oferta, em especial os de muita curta duração, assim o exija.

Para além dessas obrigações o ORT, enquanto entidade regulada, está sujeita ao Manual de Procedimentos de Gestão Global do Sistema (MPGGS – aprovado pela Diretiva n.º 10/2018, de 10 de julho, na redação da Diretiva n.º 7/2019, de 26 de fevereiro), da competência da entidade reguladora, os procedimentos do ORT, onde se incluem, entre outras, os procedimentos de mobilização de reservas.

Cabe ainda ao ORT, enquanto gestor global do sistema, realizar os estudos de análise de segurança que sejam necessários, de modo a identificar quais os incidentes que possam provocar na rede de transporte, violação das margens estabelecidas para as variáveis de controlo da segurança do sistema elétrico da sua responsabilidade, e aplicar os planos de segurança adequados.

 

A Segurança de Abastecimento (segurança do sistema a médio/longo prazo)

A segurança de abastecimento elétrico corresponde sucintamente à análise das condições de equilíbrio oferta/procura a médio/longo prazo. É por esse motivo que, principalmente, se analisam a capacidade de produção ou importação de eletricidade para satisfação das necessidade energéticas do país, mas também a previsão de consumo, com base na performance da economia, desenvolvimento da mobilidade elétrica, eficiência energética, etc., bem como a análise da capacidade da rede em garantir esse escoamento de energia, sem constrangimentos físicos ou económicos (ex: market-split, quando ocorre a diferenciação de mercado por efeito de elevada diferença de preço).

É por esse motivo que, bianualmente, a rede é analisada para casos extremos de exploração e verificada a resposta global do sistema. Com essa resposta são apresentadas propostas para adequar a resiliência da rede e propostas medidas para a sua adequação.

 

 

Serviços de Regulação de Sistema (segurança do sistema a curto prazo)

Dadas as restrições físicas do sistema elétrico, a geração deve igualar o consumo a cada instante. A isto chama-se balanço entre geração e consumo. Sendo o parâmetro “consumo” tão incerto quanto a decisão em ligar uma carga elétrica em qualquer ponto da rede, a determinação da produção prevista (contratada) é realizada com base em previsões e históricos de consumo. Nesses termos, é natural a ocorrência de diferenças entre o consumo real e produção contratada (a prevista), a que em regra se designam como desvios, podendo assumir duas vertentes distintas: o desvio físico e o económico.

Os serviços de sistema, pretendem assim garantir o ajuste entre geração e consumo, tendo em vista o reequilíbrio dos parâmetros da rede elétrica (ex.: tensão e frequência elétrica).

Numa lógica que tenta conjugar os objetivos da segurança do sistema e, ao mesmo tempo, o de potenciar as forças de mercado, os serviços de sistema são concebidos sob duas perspetivas:

a) os serviços obrigatórios, não remunerados, caracterizados por regulação de parâmetros básicos do sistema (tensão e frequência), usualmente designados como regulação primária, de resposta muito rápida (na ordem de segundos);
b) serviços complementares, remunerados numa lógica de mercado, através de regulações secundárias (até 5 min) e terciárias (até 15 min), à qual estão, resumidamente, associadas capacidades de tele-arranque de grupos geradores e regimes de interruptibilidade;

Existe ainda a possibilidade do ORT, como gestor das interligações com outras redes (atualmente apenas com a Espanha), garantir o balanço do sistema, utilizando fluxos provenientes das interligações. Faz-se notar que a questão da segurança de abastecimento é cada vez mais uma questão europeia, pretendendo-se no futuro implementar um mercado europeu de serviços de sistema.

 

Obrigação de Constituição e Manutenção de Reservas de Segurança

A lógica de regulação do sistema elétrico é algo que historicamente decorre de obrigações impostas pelo ORT aos produtores de eletricidade para garantir, não só localmente, mas também aos operadores de rede europeus na mesma área de sincronismo, os valores de reserva de potência necessários para controlar o sistema elétrico.

Atualmente, e para além da contratualização entre o ORT e o produtor dos serviços de sistema, estas obrigações são fixadas no Manual de Procedimentos da Gestão Global do Sistema do setor elétrico (MPGGS), sendo que no caso de incumprimento dos produtores, podem ainda ficar sujeitas ao impedimento de participação no mercado. As reservas contratualizadas, ficam assim ao dispor do ORT que, sempre que verifique que o sistema elétrico exige intervenção, as possa acionar em benefício da segurança de abastecimento.
 

O Papel da ENSE

É neste contexto, e sem prejuízo de competências atribuídas a outras entidades, que a ENSE tem vindo a desenvolver as suas competências de fiscalização, nomeadamente instalações e outros bens móveis e imóveis afetos à atividade económica desenvolvida no setor da energia elétrica, incluindo as atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade, bem como verificar o cumprimento do regime jurídico das instalações elétricas de serviço particular, alimentadas pelas redes do Sistema Elétrico de Serviço Público em média, alta, muito alta ou em baixa tensão, e das instalações com produção própria, de caráter temporário ou itinerante e de segurança ou de socorro.

Atenta à evolução do mercado da energia elétrica, e às suas competências de constituição, gestão e manutenção das reservas estratégicas de petróleo, a ENSE também tem vindo a desenvolver aptidões de forma a criar, para os horizontes 2030 e 2050, uma conjuntura que permita garantir e assegurar as condições de armazenamento nacionais, em função das necessidades do consumo de energia elétrica.

 
 

(1) Com exceção da capacidade de armazenamento de “energia potencial” nas albufeiras das centrais hídricas, que por gravidade se transforma em energia mecânica – através de uma turbina hídrica – e de seguida em eletricidade – através de um gerador elétrico. Ainda que existam já testes de grandes armazenagens de eletricidade em baterias em Portugal (ex.: em Évora, cerca de 500 kW), a tecnologia ainda não proporciona o armazenamento, economicamente viável. Porém verifica-se uma tendencial aposta na utilização de baterias, de pequena escala, acessíveis aos consumidores, no entanto, nesta fase, sem grande controlo dos operadores de rede.